Roberto José de Fraga Mendonça
Roberto José de Fraga Mendonça
31 Outubro 1948
Filho de Francisco António de Mendonça e de Cecília Fraga Mendonça, nasceu em Santa Cruz das Flores, a 31 de outubro de 1948, nas imediações do Porto Velho de Santa Cruz das Flores, onde foi criado e ainda reside.
A proximidade e o fascínio pelo mar marcaram, desde sempre, a sua vida. Descende de uma família de marinheiros e baleeiros. Em criança chegou a embarcar numa selha, navegando desde o Porto Velho até à boca da Ribeira. A partir dos treze anos, começou a pescar em embarcações de pesca costeira e, só mais tarde, por volta dos vinte e cinco anos se iniciou na pesca à baleia, pois o pai não havia permitido que o fizesse mais cedo. É, ainda, com a idade de treze anos que começa a trabalhar para os Serviços Florestais, na plantação de criptomérias. Antes de partir para a recruta foi, também, boletineiro, durante cerca de cinco meses, trabalhou na construção do Hotel dos Franceses e na Federação dos Municípios da Ilha das Flores, na instalação de cabos de alta tensão.
Em 1969, fez a recruta no BII 17, Angra do Heroísmo, após a qual partiu, em maio de 1970, para Lisboa, onde realizou a especialidade, no Regimento de Infantaria n.º 1 da Amadora.
A 8 de agosto do mesmo ano, partiu, a bordo do paquete Carvalho Araújo, que havia chegado dias antes dos Açores carregado de gado bovino, para a Guiné-Bissau, onde chega a 17 de agosto, após uma escala em Cabo Verde, na Ilha de São Vicente.
A Companhia de Caçadores N.º 2753, formada no já referido BII 17, em Angra e a que Roberto Mendonça pertencia, era constituída maioritariamente por açorianos. Eram conhecidos como “Os Barões” e no crachá ostentavam o lema: Noblesse Oblige (em português: A Nobreza Obriga). No N. º4 da Revista da C. CAÇ. 2753 – NHAU, de outubro de 1971, o Comandante da Companhia João Cupido, explica o porquê da designação de “Os Barões”, afirmando: “Ao longo de já catorze meses de comissão não há dúvida que os soldados da 2753 pela forma como reagiram a todo o esforço que lhe foi pedido, como reagiram a todas as contrariedades, como encararam com toda a confiança as missões mais arriscadas, mostraram bem a sua nobreza. Mostraram bem que merecem o nome de “Os Barões”. Mas a nobreza, nobreza de carácter, acarreta obrigações, cria responsabilidades. Eis, pois, o lema da companhia: A Nobreza Obriga”.1
No blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné2, que dá continuidade ao Blogue-fora-nada, criado, em 2004, com o objetivo de reconstituir memórias da guerra na Guiné, entre 1963 e 1974, Vítor Junqueira, alferes miliciano da C.CAÇ.2753, partilha várias vivências desta companhia, que designa como: “uma família, uma unidade feita à medida”. Este blogue é um espaço de partilha de experiências e conhecimentos entre antigos combatentes, constituindo, por isso, uma importante fonte para o estudo desta temática.
Em Bissau, nos primeiros meses de comissão, a C. CAÇ. 2753 foi responsável pela proteção dos trabalhos de construção da estrada Mansabá-Farim, ocupando durante três meses, Destacamentos temporários em instalações rudimentares, sem o mínimo de comodidade e com atividade operacional diária intensa3. Destes Destacamentos, o primeiro que a companhia de Roberto Mendonça conheceu foi o Destacamento Temporário do Bironque, ocupado pela C. CAÇ 2753, a 1 de dezembro de 1970. Cerca de um mês e meio depois, a companhia ocupa um novo destacamento, na zona de Madina Fula, onde permanecem até março de 1971, data em que ocupam as instalações militares de Saliquinhedim, mais conhecidas por K3, por se situarem no Km3 da margem sul do Rio Farim. Aí permaneceram por cerca de um ano, após o qual partiram para Mansabá. Em maio de 1972, “Os Barões” são, finalmente, rendidos, no entanto, permanecem, ainda, em Mansabá, em reforço da guarnição local, até meados de junho. O embarque de regresso dá-se a 26 de junho de 1972.
De entre os episódios mais caricatos que lá viveu, destaca-se uma fuga de um jipe da Polícia Militar, após um desacato num café de Bissau e consequente detenção. Um florentino, à época P. M. em Bissau, ainda conta esta história, afirmando ironicamente: “Ainda hoje procuram o Roberto na Guiné!”.
Num louvor que data de 4 de junho de 1972, o desempenho de Roberto Mendonça nas missões que cumpriu, ao longo dos vinte e um meses de comissão no Teatro Operacional da Guiné, é descrito da seguinte forma: “LOUVO o Soldado N.º 15718669 – ROBERTO JOSÉ DE FRAGA MENDONÇA da C. CAÇ. 2753, pela forma honrosa com que desempenhou todas as missões que lhe foram conferidas ao longo de 21 meses de comissão no T. O da GUINÉ. Como apontador de metralhadora ligeira teve acção notória no ataque violento que o IN fez ao destacamento de MADINA FULA e na acção “XERAZADE” onde mostrou muito sangue frio, audácia e eficiência. É pois este militar merecedor de todo o apreço quer deste Comando, quer dos seus camaradas”.4
Regressado à Ilha das Flores foi admitido como mestre e maquinista da embarcação de troço do mar da Capitania das Flores, onde prestou serviço por cerca de trinta e um anos. Reformou-se aos 56 anos de idade. A 22 de novembro de 2004 recebeu a medalha da Cruz Naval de 4ª Classe, pelo modo como desempenhou as suas funções, tendo com a sua ação contribuído para a eficiência, prestígio e cumprimento da missão da Capitania do Porto de Santa Cruz das Flores, da Autoridade Marítima Nacional e consequentemente da Marinha.
Detentor de uma grande habilidade manual e de uma criatividade inspirada, essencialmente, nos temas marítimos, desde então, tem-se dedicado aos trabalhos em madeira. Na sua pequena oficina, realiza réplicas de botes baleeiros, caravelas e outros tipos de embarcações, além de diversos trabalhos em marfim e osso de cachalote. Muito do que faz oferece, generosamente, a amigos e familiares. O restante expõe, orgulhosamente, na sua casa e garagem.
1“Noblesse Oblige”. In: NHAU – Revista da C. CAÇ. 2753, N.º 4, outubro de 1971, p.2.
3Ibidem.
4Louvor – Roberto José de Fraga Mendonça. (4 de junho de 1972). Comando Territorial Independente da Guiné.