A Fábrica Açoriana foi uma manufatura de louça cerâmica vidrada, fundada por Manuel Leite Pereira, em junho de 1872, no lugar das Alminhas, na vila da Lagoa (ilha de São Miguel, Açores). Este empreendimento desempenhou um papel significativo na história industrial dos Açores, destacando-se pela qualidade e inovação de seus produtos, contribuindo para o reconhecimento da indústria local tanto a nível nacional quanto internacional.
Natural de Peso da Régua, Manuel Leite Pereira trazia experiência prévia no setor cerâmico. Antes de fundar a Fábrica Açoriana, além de já ter trabalhado no ramo em Vila Nova de Gaia, fora sócio de uma manufatura localizada no Porto dos Carneiros, também na vila da Lagoa. Esse empreendimento, que produzia exclusivamente louça de barro vermelho, era gerido em parceria com Tomás de Ávila Boim, Manuel Joaquim de Amaral e Bernardino da Silva. A experiência acumulada por Leite Pereira nesse empreendimento foi essencial para o sucesso de sua nova fábrica.
Desde o início, a Fábrica Açoriana diversificou sua produção. Além da louça vidrada, fabricava azulejos, ladrilhos, telhas, tijolos, tubagens e miniaturas de figuras populares. Inicialmente, utilizava barro importado da Inglaterra, mas posteriormente passou a empregar matéria-prima da ilha vizinha de Santa Maria e do continente português, adaptando-se às necessidades e aos recursos locais. Em 1888, a fábrica assalariava cerca de 24 operários e 12 aprendizes, promovendo a formação profissional e o aprimoramento de técnicas tradicionais e modernas.
A qualidade dos produtos da Fábrica Açoriana foi amplamente reconhecida em várias exposições nacionais e internacionais. Dentre as mais notáveis, destacam-se: a Exposição de Artes, Ciências e Letras Micaelenses (Ponta Delgada, 1882), a Exposição de Cerâmica Portuguesa (Porto, 1882 e 1901). a American Exhibition of the Products, Arts and Manufactures of Foreign Nations (Boston, 1883), a Exposição Industrial Portuguesa (Lisboa, 1888 e 1893) e a Exposition Universelle de Paris (Paris, 1900). O reconhecimento culminou na participação na "Exposição das Indústrias, Artes e Ciências e Feira Franca" em Ponta Delgada, realizada em 1901 por ocasião da visita dos reis D. Carlos I e D. Amélia de Portugal aos Açores. Para este evento, a fábrica produziu um conjunto de três medalhões em terracota comemorativos da passagem real pelo arquipélago.
A história desta fábrica é um exemplo notável da resiliência e adaptabilidade das empresas familiares no início do século XX. Após a retirada do fundador, entre 1912 e 1914, passou por uma reorganização sob a administração da firma Manuel Leite Pereira & Sucessores, que garantiu a continuidade das operações e fortaleceu a sua posição no setor. Este período marcou a consolidação de uma base sólida para o futuro do empreendimento. Em 1914, um momento decisivo ocorreu com a aquisição de uma parte significativa do negócio por João Moniz Pacheco de Bettencourt, genro do fundador, que trouxe novas ideias e uma visão renovada para a gestão. Durante o seu mandato, até ao seu falecimento em 1918, a fábrica consolidou ainda mais o seu papel no setor cerâmico regional. Outra transformação importante teve lugar em 1920, com a entrada de Manuel da Costa Lima na liderança, após o seu casamento com a viúva de Pacheco de Bettencourt. Este evento resultou numa nova reorganização empresarial e no surgimento da Fábrica de Cerâmica Lima, um nome que simboliza tanto a continuidade quanto a renovação do espírito empreendedor que sempre caracterizou este negócio.
ANA FERNANDES e PEDRO PASCOAL DE MELO (dezembro, 2024)
Bibliografia consultada: COSTA, Francisco Carreiro da. - "Cerâmica da Lagoa", in Boletim da Sociedade Afonso de Chaves, vol. II, n.º 4 (1941), Angra do Heroísmo, Sociedade Afonso de Chaves, pp. 183-194; MARTINS, Rui de Sousa. - A cerâmica da Lagoa. Lagoa: Câmara Municipal, 2000; MARTINS. Rui de Sousa. - Representações dos costumes populares na escultura cerâmica dos Açores", in Arquipélago/História, 2.º série, vol. IX (2005), Ponta Delgada, Universidade dos Açores, pp. 409-464; MOSCATEL, Cristina, e QUEIROZ, Francisco. - "A influência de Gaia na cerâmica de produção açoriana", in Património de Gaia no Mundo [coord. J. A. Gonçalves Guimarães & Francisco Queiroz]. Vila Nova de Gaia: Câmara Municipal, 2021, pp. 138-143 [Disponível em A influência de Gaia na cerâmica de produção açoriana. Academia.edu. Acesso em: 16 dez. 2024].